quinta-feira, 19 de julho de 2012

O Gosto das Cores

Este post não é continuação do anterior. Nele não há Marcelas, nem tintas, nem pessoas que lambem tintas. Este post tampouco é um conto de ficção. Este é um post sobre como eu descobri que sou sinestésica.
si-nes-te-si-a
sf (sin+estesia) Med 1 Sensação secundária que acompanha uma percepção. 2 Sensação em um lugar, devida a um estímulo em outro. 3 Condição em que a impressão de um sentido é percebida como sensação de outro.
Sim, eu "sofro" de sinestesia. "Sofrer" entre aspas porque pesquisei muito desde que percebi que algo era diferente na forma como eu recebia estímulos através dos meus cinco sentidos, e nunca encontrei um único caso de um sinestésico que tivesse algum problema ou dificuldade devido a esta "sopa" sensorial.

Esse quadro é tão saboroso, não acham?
Há vários tipos de sinestesia. Na verdade, ela se apresenta de forma completamente diferente para cada pessoa. Há aqueles que vêem cores ou formas geométricas ao ouvirem certos sons ou músicas. Há aqueles para quem cada número ou letra possui uma cor ou som único. Existe gente que pode sentir cheiros ou gostos ao verem ou ouvirem determinadas imagens, cores, músicas.


Para quem nunca teve uma experiência sinestésica, é difícil explicar como eu pude demorar tanto tempo para perceber que era uma dessas pessoas. Mas a verdade é que na maioria dos casos essa mistura de sentidos ocorre de forma tão natural e desde tão cedo que muitas pessoas nem sequer param para pensar que algo nelas é diferente. E foi assim que aconteceu comigo.

Minha primeira experiência sinestésica deve ter ocorrido quando eu era muito nova. Como - repito - demorei para perceber que algo era diferente, não tenho uma memória exata de como funcionavam meus sentidos quando eu era criança. 

Foi apenas há mais ou menos uns 2 anos que finalmente me dei conta de ter algo "estranho" nos meus sentidos. Foi num dia em que me perdi no Youtube vendo vídeos de programas de quando eu era criança. Mais precisamente, foi quando vi este vídeo:


Este é o desenho Bojan, que passava no Glub Glub, na TV Cultura, quando eu era bem pequena. E quando o revi, fui invadida por sensações que há muito tempo não experimentava. No início não sabia muito bem o que era, e tive que rever o vídeo várias e várias vezes até identificá-las. O que eu estava sentindo era o gosto das cores.

Diferente dos sinestésicos mais "famosos", minhas experiências não são assim tão claras. Sinto o gosto das cores, mas não de uma forma tão concreta como alguns sinestésicos relatam. É como uma lembrança de um gosto, um gosto que eu sinto mas sei que não está na minha boca. Mais ou menos quando a gente lembra do gosto da macarronada de domingo que só a vovó sabe fazer, sabem?

Também diferente dos sinestésicos "famosos", os gostos que eu sinto não são tão bem definidos e não necessariamente se repetem com a mesma cor. Também não é em todos os momentos que os sinto. 

Além de gostos, já experimentei outras formas de sinestesia, embora estas ainda mais esparsas e difusas do que a minha sinestesia original. Já vi cores ao tatear meu quarto no escuro ou o interior da minha bolsa à procura de algum objeto perdido. Já senti cheiros que não estavam lá ao recordar de algum lugar ou momento da minha vida.

Azul tem um gosto muito bom.
A mais estranha - ou assustadora, ou maluca, escolha o adjetivo ao seu gosto - experiência sinestésica eu tive poucas noites atrás. Estava me preparando para dormir com o namorado. Tenho mania - talvez fale sobre isso qualquer dia desses - de esfregar meus dedos nos dedos dele antes de dormir. Luz apagada, fechei os olhos e peguei na mão dele. No mesmo momento fui inundada por todas as sensações possíveis. Pude ver no escuro a cor azul. Como se a mão dele e tudo o mais ao redor estivesse banhado por uma luz ou envolto em papel celofane azul. Lembrando: tudo estava escuro. Senti também o gosto daquela cor azul que eu via ao redor, de olhos fechados. E, bem levemente, fui capaz de sentir o cheiro azul que pintava tudo na minha mente.

Ainda não se sabe exatamente o que faz com que algumas pessoas sejam sinestésicas. Alguns cientistas acreditam que tenha origem genética. Outros dizem que é um defeito no cérebro que faz as áreas dos sentidos se misturarem. O que sei é que, defeito ou não, ser sinestésica faz com que eu me sinta quase uma Alice perdida no País das Maravilhas.

'But I don't want to go among mad people,' said Alice. 'Oh, you can't help that,' said the cat. 'We're all mad here.' (Lewis Carroll)

1 comentários:

Anônimo disse...

realmente, vc sabe escrever. Bjs.Tia Chris